Xangô (2)
Religiões de matriz africana rendem homenagem, no dia 30 de setembro, ao Orixá Xangô. Considerado Orixá da sabedoria, da política e da justiça, é sincretizado, não por acaso, com São João Batista, São Pedro e São Jerônimo, santos católicos ligados à Justiça Divina, especialmente, São Jerônimo, estudioso de retórica e oratória, artes peculiares aos profissionais que defendem, protegem ou intercedem em favor daqueles que necessitam, como os especialistas em ciências jurídicas, juízes, promotores, defensores e advogados.
Falar sobre Xangô é, acima de tudo, discorrer sobre justiça e, principalmente, trazer uma reflexão sobre aspectos que definem a aplicação da Justiça Divina, nesse contexto, da Justiça de Xangô e da Justiça Terrena, em relação aos nossos atos.
Quando problemas, tristezas e dificuldades nos afligem, recorremos, invariavelmente, invocando a intervenção da Justiça Divina na tentativa de aliviar o sofrimento por acreditarmos, na maioria das vezes, que não merecemos passar tudo que estejamos passando. Outras vezes acionamos a Justiça Terrena por meio de ações penais, cíveis, trabalhistas, etc.… sempre buscando aquilo que “julgamos” merecer.
Será que, em algum momento dessa busca pela satisfação de nossos anseios, quando, por exemplo, pedimos a intercessão da Justiça de Xangô, lembramos que ela atua, em primeiro lugar, em nós mesmos, avaliando o quanto temos sido justos em nossa vida e com nossos semelhantes?
Ou, ainda, será que fazemos essa reflexão quando demandamos por via judicial, com o intuito de processar algo ou alguém, considerando-nos “injustiçados”?
Será que lembramos que o Senhor da Justiça pesa os prós e os contras em uma análise judicial e agirá de acordo com o merecimento de cada um?
Certamente, não! Nossa irreflexão faz-nos enxergar apenas nossas necessidades, preocupações e anseios momentâneos, esquecemos que a justiça que buscamos será concedida de acordo com nossa necessidade e, acima de tudo, com nosso merecimento.
Entender o funcionamento da “balança” de Xangô, um de seus símbolos, que expressa o equilíbrio do julgamento, implica compreender que aquilo que não estiver de acordo com a Justiça Divina será analisado e contabilizado em desfavor, no momento certo.
Logo, precisamos nos conscientizar sobre a importância de avaliarmos diariamente nossos atos, lembrando que nosso sofrimento será proporcional ao sofrimento que por ventura causarmos aos outros, o que fazemos ou deixamos de fazer, inevitavelmente, repercutirá futuramente na construção de nosso destino. Então, devemos praticar a chamada resignação dinâmica, aceitando o destino como processo natural para nossa evolução, mas não deixando de buscar a melhoria de nossa condição a cada dia, em cada ato.
Que, ao invocarmos a proteção e a mediação desse Deus do Trovão, não esqueçamos que, quando Xangô aplica sua justiça, a retidão e a honestidade superam seu caráter arbitrário e que suas medidas, embora impostas, serão sempre justas!
Para a Umbanda, os Orixás são a própria manifestação de Deus. Sendo assim, Orixá não é deus, não é espírito, e sim a própria qualidade Divina manifestada. Desta forma, temos como uma das qualidades Divinas a justiça, a verdadeira justiça, o equilíbrio, manifestados no Orixá Xangô. É ele quem luta para manter o universo divino balanceado e consistente, sendo a própria manifestação da justiça e do equilíbrio divino. É o agente da Lei de Causa e Efeito - lei esta que ensina seus filhos a ter responsabilidade por cada ato e, obrigatoriamente, viver suas consequências, sejam elas harmoniosas e felizes ou de sofrimento, mas sempre levando à evolução (equilíbrio cármico). Tem como palavras-chaves: sabedoria, prudência, honestidade, ponderação, igualdade e justiça.
Sua força está concentrada em seu sítio vibracional, as formações rochosas cristalinas, nos maciços, nos terrenos rochosos à flor da terra e na coesão de suas moléculas. As pedras e rochas são símbolos de Xangô na Umbanda, pois representam a estabilidade do mineral. Sua função faz de Xangô uma energia íntegra, indivisível e inflexível. Quando as pedras se chocam, saem faíscas que iniciam o fogo. Por isso, o elemento de Xangô é o fogo. E essa é uma analogia da chama purificadora e equilibradora de Xangô.
Suas cores são marrom e branco e sua saudação “Kaô Kabecilê”. Seu símbolo é o Oxé, um machado de dois gumes, que representa a força da justiça que corta para os dois lados, e a neutralidade nos julgamentos. Seu poder é representado também pela balança, simbolizando o equilíbrio do julgamento.
Xangô é a Vibração ou Linha de Força Espiritual, sob a qual estão situados todos os Espíritos que fazem executar a Lei Cármica (não confundir com os Exus, que EXECUTAM) pela aferição das Causas e que na Umbanda se apresentam como Caboclos. É a faixa vibratória que dá assistência e formação direta aos Tribunais Inferiores do Astral. Segundo a Lei do Verbo, essa linha ou vibração de Xangô reflete ou traduz: Movimento de Vibração da Energia Oculta – O Raio Oculto – a Alma ou o Senhor do Fogo – o Dirigente de Almas – Xangô = o Senhor das Almas e do Elemento Fogo.
Como Xangô atua.
Quando se pede a intervenção de Xangô pela justiça é preciso estar atento que antes de nos ajudar, ele irá analisar a nossa conduta. Ele verifica se temos sido justos em nossa vida com os nossos semelhantes.
A balança deste Orixá busca o equilíbrio, e tudo o que não está de acordo com a Justiça Divina é contado. Ele nos provém da justiça que buscamos de acordo com a nossa necessidade e merecimento.
Quem invoca a justiça de Xangô deve ter em mente que também será julgado, e se estiver devendo à justiça divina, também terá que pagar. Por isto, cuidado com o que pede, pois poderá receber mais do que pensa que merece!
Sincretismo de Xangô
Xangô na Umbanda é sincretizado com santos cristãos, como São João Batista, São Pedro e São Jerônimo. Essa assimilação acontece porque estes santos (em especial São Jerônimo) são santos também ligados à justiça divina.
Fontes:
Mutti, Daisy; Chaves, Lizete - Ensinamentos Básicos de Umbanda. 1ª ed. -Porto Alegre: Legião, 2016. 134p.
Vilarinho, Maria Regina – Umbanda: Luz para a Alma – Brasília, DF, 2013. 477p.
Texto original, sem revisão.